sábado, 30 de junho de 2012


Juristas denunciam Pinheirinho à Comissão Interamericana de Direitos Humanos

publicado em 13 de junho de 2012 às 8:01
Juristas denunciam desocupação do Pinheirinho à Comissão Interamericana de Direitos Humanos

A desocupação do Pinheirinho, ocorrida no dia 22 de janeiro último, constituiu-se em brutal violação dos mais elementares direitos da pessoa humana. Aproximadamente 6 mil pessoas foram atingidas, grande parte delas perdendo todos os seus bens de uso pessoal, documentos e o mínimo necessário para a sobrevivência. Até o presente o Estado não ofereceu condições para que essas pessoas retomassem suas vidas com um mínimo de dignidade. Foram e continuam sendo tratados como brasileiros de segunda classe.
Para que fatos como esse nunca mais se repitam, para que jamais o Estado, beneficiando um único proprietário, por meio de uma ordem judicial ilegítima, atinja tão duramente homens, mulheres, crianças de todas as idades, idosos e enfermos, apresentamos à Comissão Interamericana de Direitos Humanos uma denúncia.

Pedimos medidas legislativas e políticas públicas urgentes para que o Direito brasileiro não permita mais episódios como esse. Pedimos indenizações materiais e morais para todas as vítimas da brutalidade do Estado. Pedimos apuração de responsabilidades das autoridades envolvidas, incluindo o governador do Estado de São Paulo e o presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Convidamos todos para o ato que será realizado no dia 22 de junho próximo, às 11 horas, na Sala do Estudante da Faculdade de Direito da USP para divulgação da denúncia e detalhamento a respeito de seu conteúdo.
Assinam, entre outros:
Fabio Konder Comparatto
Sindicato dos Advogados de São Paulo
Rede Social de Justiça e Direitos Humanos
Associação dos Moradores do Pinheirinho
José Geraldo de Souza Junior (reitor da UnB)

Massacre do Pinheirinho denunciado ao CNJ e à OEA

publicado em 22 de junho de 2012 às 7:53

Ex-moradores do Pinheirinho, movimentos de direitos humanos e advogados entregaram à ministra Eliane Calmon Reclamação Disciplinar contra cinco membros do Judiciário paulista por Conceição Lemes

Nesta sexta-feira 22, a desocupação do Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), completa cinco meses. Mais de 6 mil pessoashomens, mulheres, crianças de todas as idades, idosos e enfermos – foram retiradas violentamente do terreno em que moravam há mais de oito anos por uma tropa de choque de mais de 2 mil policiais  da Polícia Militar do Estado de São Paulo e da Guarda Civil Metropolitana. A maior parte dos moradores perdeu tudo: desde casa (todas demolidas), móveis, fogão, geladeira, TV, computador, roupas até documentos.
Um verdadeiro massacre autorizado pelo governador Geraldo Alckmin e o prefeito Eduardo Cury, ambos do PSDB, com a complacência do Judiciário paulista.
Para que fatos como esse jamais se repitam, vários juristas, entre os quais os professores Fabio Konder Comparato, titular da Faculdade de Direito da USP, e José Geraldo de Souza Júnior, reitor da Universidade de Brasília (UnB), denunciaram o caso à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Na denúncia, pedem:
* Medidas legislativas e políticas públicas urgentes para que o Estado brasileiro não permita mais episódios como o Pinheirinho nem se confira tratamento semelhante a outros graves conflitos sociais.
* Apuração de responsabilidade das autoridades envolvidas, incluindo o governador do Estado de São Paulo e o presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
A divulgação da representação à OEA será feita nesta sexta-feira, às 11h, durante ato na Sala do Estudante da Faculdade de Direito da USP.
É a segunda denúncia formalizada esta semana contra a violência da desocupação do Pinheirinho e as irregularidades do procedimento judicial.
A primeira, na terça-feira 19, foi a Reclamação Disciplinar ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra cinco autoridades do Judiciário paulista:
Ivan Sartori, presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo
Cândido Além, desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo
Rodrigo Capez, juiz assessor da presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo
Marcia Faria Mathey Loureiro, juíza da 6ª Vara Cível de São José dos Campos
Luiz Beethoven Giffoni Ferreira, juiz da 18ª Vara Cível do Fórum Central João Mendes Júnior.
Pedida ao CNJ a punição de Ivan Sartori, Rodrigo Capez, Márcia Loureiro, Luiz Beethoven, além de Cândido que não está nas fotos
A denúncia, assinada por Dalmo Dallari, Celso Antônio Bandeira de Mello, Fábio Konder Comparato e Cezar Britto, entre outros juristas, foi entregue à própria Corregedora Nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, durante reunião em Brasília.  Na representação de 44 páginas, é solicitada instauração de processo administrativo disciplinar.
Sobre a conduta da juíza Márcia Loureiro a representação ao CNJ salienta:
“Diante da condução abertamente parcial em favor da massa falida, também foi apresentada exceção de suspeição contra a juíza Márcia Loureiro “(noticiado às fls. 693-695 – Proc. nº 0296050-27.2011.8.26.0000)”.
“A juíza em questão fez todo um trabalho de divulgação midiática, em uma ampla campanha de nítido caráter político contra a comunidade do Pinheirinho. Várias foram suas intervenções públicas contra aquelas pessoas 15 indefesas, além das referidas declarações de altíssima impropriedade acerca do valor da área”.
“Como se vê, dizer-se da falta de imparcialidade na condução do processo é minimizar o completo empenho da representada em favorecer os interesses da massa falida. Aqui cabe lembrar – para a completa perplexidade – que o pedido dos advogados dessa massa falida era para a realização de uma mera audiência de instrução”.
Sobre a conduta do desembargador Ivan Sartori a mesma representação afirma:
“Todas as tratativas entabuladas por parlamentares e magistrados, sob a ciência e participação ativa do Presidente do TJSP, revelaram-se parte de um ardil”.
“O mesmo desembargador IVAN SARTORI, que no dia 20 de janeiro de 2012 se reuniu com os parlamentares, designou um juiz (RODRIGO CAPEZ) para dirigir o massacre da desocupação do Pinheirinho, dois dias depois, em plena madrugada de domingo, 22 de janeiro”.
“Por mais incrível que pareça, as condutas viciadas praticadas pela magistrada de primeiro grau de jurisdição foram mais que respaldadas pelo presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ampliadas ao grau da barbárie, em cenário de instituição de um autêntico juízo de exceção”.
“De início, ressalte-se a brutal ilegalidade na assunção de uma jurisdição que não lhe tocava, em completa violação às regras de competência”.
“Não existe nem mesmo um arremedo de norma que ampare a usurpação de competência encetada pelo desembargador presidente”.
“Essa exaustiva reprodução textual visou demonstrar de maneira definitiva que não cabia ao desembargador presidente do tribunal paulista exercer o papel que se arvorou em praticar – de algoz de uma população indefesa. Tolerar um desmando dessa magnitude seria renunciar ao próprio estatuto de democracia”.
“Recebendo ordem da justiça federal para suspender a reintegração de posse, o presidente do tribunal fez chegar ao seu subordinado, o juiz RODRIGO CAPEZ, uma contra ordem para “repelir forças federais”, como já foi noticiado na exposição factual. Ora, isso caracteriza nada menos do que a quebra do pacto federativo, com bem sintetizou o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, criticando a postura do presidente do TJSP”.
Sobre a conduta do juiz Rodrigo Capez a representação ao CNJ diz:
“O juiz CAPEZ teve papel de destaque nas articulações que engendraram o ardil. Os depoimentos dos próprios parlamentares certamente delimitará em qual medida essa ação se desenvolveu”.
“As referências às violações éticas já apontadas no tópico antecedente aplicam-se igualmente aqui. Embora transpareça ser apenas um títere assomado pelabanalidade do mal, seu protagonismo é indiscutível”.
“Dessarte, sua posição servil à presidência não o eximia da adoção de uma conduta compatível com os ditames éticos e legais. É isso que deverá ser avaliado pelo órgão correcional”.
Da audiência com a ministra Eliane Calmon participaram  ex-moradores do Pinheirinho, entidades de direitos humanos e os advogados Cezar Britto (ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil — OAB-Federal), Aristeu Neto, Antonio Ferreira, Camila Gomes, Rodrigo Camargo, Marcus Vinícius (secretário-geral da OAB) e Arthur Motta, assessor do senador Eduardo Suplicy (PT-SP).
Todos puderam se manifestar, inclusive o senhor Valdir, representante da Associação de Moradores, que descreveu os requintes de crueldade com os quais foi levada a cabo a ação policial de desocupação.
“A audiência foi excelente”, avalia Antônio Ferreira, advogado que acompanha o caso desde o princípio. “A ministra nos escutou e sentimos preocupação da sua parte com os fatos relatados. Percebemos que a Corregedora tinha conhecimento sobre o caso. Saímos de lá com a certeza de que os fatos serão averiguados.”
Camila Gomes, advogada do caso, salienta: “Ficamos com nítida impressão de que o CNJ está preocupado não apenas com a regularidade técnica da atuação dos magistrados, mas também com a ética e a responsabilidade social no exercício da função jurisdicional”.
Para o advogado Cezar Britto, ex-presidente da OAB, a reunião no CNJ foi bastante proveitosa principalmente porque dois fatos referentes ao Pinheirinho geram conseqüências positivas na Magistratura.
“O primeiro quando se pediu ao CNJ que adote procedimentos uniformes em relação a conflitos sociais, evitando violações de direitos humanos e possíveis massacres dos cidadãos, fortalecendo assim a imagem do Poder Judiciário como distribuidor de justiça”, observa Britto. “O segundo, e não menos importante, é a adoção de medidas terapêuticas para evitar que fatos como os de Pinheirinho se repitam, caracterizado no pedido de punição aos magistrados envolvidos.”

quarta-feira, 27 de junho de 2012

 Greve do funcionalismo federal já atinge dez órgãos públicos

Ter, 26 de Junho de 2012 13:14 PDF 
Trabalhadores da educação em greve!
Os técnicos-administrativos das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) estão em greve há 15 dias e o Governo nada de apresentar contra-proposta aos trabalhadores. Os docentes das universidades federais estão em greve desde 17 de maio. No dia 11 de junho foi deflagrada a paralisação dos técnicos administrativos e no dia 13 os servidores federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica também aderiram ao movimento.

Já são 57 universidades e 22 institutos federais sem aulas. Nada menos que 70% do ensino superior federal estão com as aulas suspensas. A greve dos servidores públicos federais já atinge dez órgãos do governo e também o Itamaraty, onde a paralisação é inédita. Trabalhadores da Funai, Funasa, Incra e dos ministérios do Desenvolvimento Agrário, Justiça, Previdência Social e da  Saúde aderiram ao movimento de greve. Até servidores do próprio Ministério do Trabalho também paralisaram as atividades.

As adesões sucessivas ao movimento da greve deixam claro o tamanho da insatisfação dos trabalhadores federais com a política intransigente que esse Governo vem tratando a categoria e não faz nenhum esforço para sentar na mesa de negociação e definir uma política descente de carreira e de salário aos trabalhadores.

Aqui no Pará a greve avança a cada dia com novas adesões. UFPA, UFRA e UFOPA e estão em greve e sem previsão de acabar até o Governo atender à pauta de reivindicações dos trabalhadores. Na UFRA, os portões de acesso à universidade foram fechados na semana passada. Serviços como a circulação do ônibus Bagé e o horário das atividades esportivas realizadas no campus foram reduzidos. Assim como na UFPA, onde o Restaurante Universitário parou de funcionar e o atendimento administrativo foi reduzido. Na sexta-feira (22) a reitoria e os portões de acesso à universidade foram fechados, apenas para chamar a atenção do Governo e da comunidade para a situação que vivem os trabalhadores das IFE’s.
Sem negociação a greve continua por tempo indeterminado.

domingo, 17 de junho de 2012

Veja/Cachoeira: A mídia sob suspeita

Por Laurindo Lalo Leal Filho, na Revista do Brasil:

De narradora dos acontecimentos a revista semanal da Abril tornou-se personagem, revelando um envolvimento nunca visto de forma tão escancarada na cena política brasileira. Gravações feitas pela Polícia Federal, com autorização da Justiça, não deixam dúvidas. O contraventor Carlinhos Cachoeira era mais do que fonte de informações.

Seu relacionamento com o diretor da sucursal de Veja em Brasília, Policarpo Junior, permitia a ele sugerir até a seção da revista em que determinadas notas de seu interesse deveriam ser estampadas. O pouco que se revelou até aqui permite concluir que a publicação tornou-se instrumento de Cachoeira para remover do governo obstáculos aos seus objetivos.

Um desses entraves estaria no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), do Ministério dos Transportes, e dificultava a atuação da Delta Construções, empresa que teria fortes ligações com o contraventor.

Segundo o jornalista Luis Nassif, a matéria da Veja sobre o Dnit saiu em 3 de junho de 2011. “A diretoria estava atrapalhando os negócios da Delta. Foi o mesmo modo de operação do episódio dos Correios –que daria origem ao chamado “mensalão”. Cachoeira dava os dados, Veja publicava e desalojava os adversários de Cachoeira.” Com isso cumpria também os objetivos de situar-se como vigilante de desmandos e fustigar os governos Lula e Dilma, pelos quais nunca demonstrou simpatia alguma.

Basta lembrar a capa de maio de 2006 com Lula levando um pé no traseiro, juntando numa só imagem grosseria e desres­peito. Para não falar de outras, do ano anterior, instigando o “impeachment” do presidente da República. O sucesso dos dois governos Lula e os altos índices de aprovação recebidos até agora pela presidenta Dilma Rousseff parecem ter exacerbado o furor da revista. A proximidade do diretor da sucursal de Brasília com Cachoeira, e deste com o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO), sempre elogiado por Veja, veio a calhar. Até surgirem as gravações da Polícia Federal levando a revista a um recolhimento político só quebrado em defesas tíbias de seu funcionário e do que ela chama de “liberdade de imprensa”.

Veja diz-se “enganada pela fonte”, argumento desmentido pelo delegado federal Matheus Mella Rodrigues, coordenador da Operação Monte Carlo. O policial mostrou que o jornalista Policarpo Junior sabia das relações de Demóstenes com Cachoeira, mas nunca as denunciou, protegendo “meliantes”, como resumiu com propriedade a revista CartaCapital.

Livre, pero no mucho

Segundo Veja, a “liberdade de imprensa” estaria ameaçada se o jornalista, ou seu patrão Roberto Civita, fosse chamado a depor na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) aberta no Congresso Nacional para investigar o caso. Mas, na mesma edição em que supostamente põe o direito à informação acima de tudo, clama por um controle planetário da internet, agastada com a circulação de informações sobre seus descaminhos na rede. A internet foi o principal meio de exposição dos detalhes da suspeita relação Cachoeira-Demóstenes-Veja, e uma enxurrada de expressões nada elogiosas levaram a revista ao topo dos assuntos mais mencionados no Twitter.

Os principais veículos de alcance nacional silenciaram ou apoiaram a relação – exceção feita à Rede Record e à revista CartaCapital. Alguns, como O Globo, não titubearam em tomar as dores da Editora Abril. Por um de seus colunistas, Merval Pereira, o jornal isentou a revista de responsabilidades. Depois, em editorial, reagiu à comparação feita por CartaCapital entre o dono da Editora Abril e o magnata Rupert Murdoch, punido pela Justiça britânica pelo mau uso de seus veículos de comunicação no Reino Unido.

A Folha de S.Paulo, também em editorial, aliou-se a Veja. Mas sua ombudsman, Suzana Singer, que tem a incumbência de criticar o desempenho do jornal, pelo menos levantou uma dúvida ao dizer que “não se sabe se algo comprometedor envolvendo a imprensa surgirá desse lamaçal”. Para lembrar em seguida que ao PT interessa com o caso Cachoeira empastelar o “mensalão” a ser julgado em breve, e conclui dizendo: “A imprensa não pode cair na armadilha de permitir que um escândalo anule o outro. Tem o dever de apurar tudo – mas sem se poupar. É hora de dar um exemplo de transparência”. Mas a cobertura da Folha das relações Cachoeira-Demóstenes-Veja limita-se a notas superficiais.
 
 
Intocável

A ideia de que o caso Cachoeira seria uma forma de desviar as atenções sobre a campanha pelo julgamento dos acusados no caso do “mensalão” foi alardeada pela mídia. E utilizada pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, para se livrar da acusação de ter sido negligente. A PF encaminhou a Gurgel a denúncia sobre as relações promíscuas entre Cachoeira e Demóstenes em 2009. Se ele tivesse dado andamento à denúncia, o processo se tornaria público e poderia ter comprometido no ano seguinte a eleição de Demóstenes ao Senado, de Marconi Perillo (PSDB) ao governo de Goiás e de outros políticos suspeitos de servir a Cachoeira.

Em vez de explicar por que segurou o processo, Gurgel respondeu às acusações sob a alegação de que partiam dos envolvidos no processo do “mensalão”, temerosos diante da iminência do julgamento no qual ele será o acusador.

A CPMI começou em maio e tem seis meses para concluir as apurações. Ainda não havia mostrado, porém, o mesmo ânimo convocatório em relação aos governadores envolvidos com a Delta Construções e muito menos ao jornalista de Veja e seu patrão. Os governadores, por acordos político-partidários; o jornalista e o empresário, não se sabe bem as razões, embora possam ser formuladas hipóteses.

Uma delas é a de que o maior partido da base governista, o PMDB, estaria sendo sensível ao lobby da mídia por uma blindagem. Com uma CPMI em banho-maria, o partido não seria muito arranhado com a exposição de políticos peemedebistas a investigações. E o PT, concorrente na disputa por espaço no governo, não capitalizaria demais os resultados.

A concentração em poucos e poderosos grupos nacionais e transnacionais deu à mídia um poder nunca antes alcançado, muitas vezes superior aos próprios poderes republicanos. Assim, governos e outras instituições públicas tornam-se reféns dos meios de comunicação e temem enfrentá-los. Apenas em três ocasiões de nossa história veículos de comunicação foram alvo de investigações por parte de CPIs.

Em 1953, o dono do Última Hora, Samuel Wainer, sugeriu ao presidente Getúlio Vargas que seu jornal fosse investigado quanto às operações de crédito mantidas com o Banco do Brasil, como lembra o professor Venício Lima, da Universidade de Brasília. Dez anos depois, o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad) foi acusado de ter ligações com a CIA e receber recursos dos Estados Unidos para interferir nas eleições brasileiras. O instituto chegou a alugar por três meses, num período pré-eleitoral, o jornal A Noite do Rio, para colocá-lo a serviço da oposição ao presidente João Goulart. E em 1966 foi aberta investigação do acordo entre as Organizações Globo e o grupo de mídia estadunidense Time-Life. Uma operação de US$ 6 milhões, em benefício da TV Globo, acabou com o império dos Diários Associados de Assis Chateaubriand.
Testemunha de defesa

Há uma outra inquirição de jornalista que não se enquadra entre os casos mencionados, embora seja altamente significativa para os dias de hoje. Trata-se da ida a uma Comissão Parlamentar de Inquérito, em 2005, do mesmo Policarpo Junior. Na ocasião, o chefe de organização criminiosa se dizia vítima de chantagem por parte de um deputado carioca que estaria exigindo propina para não colocar seu nome no relatório final de uma CPI instalada na Assembleia Legislativa do Rio. Policarpo testemunhou em defesa do bicheiro e nenhum jornal nem a ABI alegaram tratar-se de uma intimidação à imprensa.

Uma das explicações para essa baixa exposição de jornais e jornalistas a investigações está no poder de interferência dos grupos midiáticos na política eleitoral. Exemplo clássico é a frase da viúva do proprietário das Organizações Globo referindo-se ao governo Collor: “O Roberto colocou ele na Presidência e depois tirou. Durou pouco. Ele se enganou”, disse com candura dona Lily no lançamento do seu livro Roberto & Lily, em 2005. Mas essa não foi uma ação isolada. Para derrotar Lula em 1989, Globo e Veja faziam dobradinha perfeita, como agora. Demonizavam Lula e exaltavam o jovem governador de Alagoas, “caçador de marajás”.

Essa articulação tornou-se hoje mais orgânica. A presidenta da Associação Nacional de Jornais (ANJ), que representa os proprietários de veículos, Judith Brito, assumiu o papel de oposição ao governo Lula. De modo mais discreto, mas não menos eficiente, trabalha o Instituto Millenium, que reúne articulistas, jornalistas e patrões da imprensa. E realiza eventos em que os convidados aliam-se ao que há de mais conservador na sociedade para afinar suas linhas de cobertura. Em um deles estavam Roberto Civita (Abril), Otavio Frias Filho (Folha) e Roberto Irineu Marinho (Globo).

Vários colaboradores, exibidos no site do instituto, escrevem e falam contra as cotas raciais nas universidades, criticam a política econômica dos governos Lula e Dilma, seja qual for, louvam o governo Fernando Henrique Cardoso, discordam da atual política externa brasileira e fizeram campanha contra a criação da CPMI do Cachoeira. São ações orquestradas que lembram as do Ibad, antes mencionado.

As evidências atuais indicam a necessidade de uma investigação séria sobre o papel de setores da mídia no caso Cachoeira. Os indícios vão além do jogo político e apontam para conluios com o crime comum. No entanto, até o momento, a CPMI não mostrou disposição para enfrentar o poder da mídia, que, quando acuada, conta com a defesa não apenas dos proprietários como também de parte de seus empregados.

Cabe lembrar a observação frequente do jornalista Mino Carta sobre a peculiaridade brasileira de jornalista chamar patrão de colega. Com isso diluem-se interesses de classe e uma difusa “liberdade de imprensa” é utilizada para encobrir contatos altamente suspeitos.

Até entidades respeitáveis como a Associação Brasileira de Imprensa, por seu presidente, Maurício Azêdo, confundem as coisas. Em depoimento ao programa Observatório da Imprensa, da TV Brasil, Azêdo não admite a ida de jornalistas à CPMI para prestar depoimentos, sob a alegação de intimidação ao trabalho jornalístico, mas condena a promiscuidade de alguns profissionais com fontes próximas ou ligadas ao crime. Com isso dá ao jornalista uma imunidade que nenhum outro cidadão tem.

Nesse mesmo programa, o professor Venício Lima ressaltou o impacto do caso das escutas ilegais promovidas pelo jornal News of the World sobre as relações mídia-sociedade na Inglaterra. “Levou Murdoch (o dono do jornal) e seus jornalistas a depor não só na Comissão de Esportes, Mídia e Cultura da Câmara dos Comuns como na Comissão Leveson, que tem caráter de inquérito policial.” Nada disso ameaçou a liberdade da imprensa britânica.

Aqui, apesar da resistência com forte apelo corporativo da mídia e de parte dos seus empregados, vozes importantes lembram que ninguém está imune a convocações feitas pelo Congresso Nacional para prestar esclarecimentos. À Record News, o presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), foi direto ao ponto: “Todos devem ser investigados no setor público, privado e na imprensa. Sem paixões e sem arroubos. Nós vamos descobrir muitas coisas quando forem feitas as quebras de sigilo – o fiscal, por exemplo. Devemos apoiar sempre a liberdade de expressão. Mas não podemos confundi-la com uma organização criminosa. Para o bem da sociedade e da própria liberdade de expressão.”

quinta-feira, 14 de junho de 2012


Cúpula dos Povos debate mídia livre

Por André Vieira, no Observatório do Direito à Comunicação:

O direito à comunicação também estará na pauta dos eventos paralelos à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20). O II Fórum Mundial de Mídia Livre (FMML) acontece nos dias 16 e 17 de junho na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), no bairro da Urca. O encontro se baseia em quatro eixos centrais: direito à comunicação; políticas públicas; apropriação tecnológica e movimentos sociais. O Fórum integra a programação da Cúpula dos Povos, que, de 15 a 23 de junho, vai ocupar a capital fluminense com reuniões, encontros, debates e manifestações, entre outras atividades.

Segundo Bia Barbosa, integrante do Intervozes, a convocação do FMML durante a Cúpula dos Povos servirá para que as mídias livres contribuam para a agenda dos movimentos sociais. "Enviaremos propostas e faremos debates com o objetivo de construir uma agenda de luta junto aos movimentos sociais. A comunicação e a cultura como bens da humanidade e devem estar articuladas na defesa da justiça social e ambiental", afirma Bia. A militante acrescenta ainda que a plenária final do FMML aprovará propostas que serão enviadas às assembleias de convergência da Cúpula.


Na Cúpula dos Povos, as mídias livres contribuirão com propostas e debates para fortalecer a agenda dos bens comuns, onde comunicação e cultura são considerados grandes bens da humanidade, indissociáveis da justiça ambiental e social. O direito e a defesa da comunicação devem ser inseridos nos documentos, agendas e propostas dos povos representados por seus movimentos sociais no Rio de Janeiro.



Na programação, além de painéis específicos sobre os eixos temáticos, acontece um debate sobre “Mulher, Mídia e Bens de Consumo”. A tarde do dia 17/06 será ocupada pelas atividades autogestionadas, que foram apresentadas por ativistas e entidades da sociedade civil. A programação completa do II FMML está disponível no site do evento.


A Rede dos Povos

Invisibilizada pela mídia tradicional, a Cúpula dos Povos inaugurou uma rede de produção de mídia compartilhada, a Rede dos Povos. Reunindo meios de comunicação ligados aos movimentos sociais, a iniciativa busca mobilizar o público para o evento e também criar novos mecanismos para distribuir a comunicação com conteúdo crítico, poucas vezes exibido pela corporações midiáticas.


Segundo Monike Mar, jornalista da TV Cúpula, a Rede dos Povos está aberta à participação de coletivos e indivíduos que queiram divulgar suas produções. "Antes da Cúpula, as produções puderam ser enviadas para nossa plataforma na web e assim formar um acervo para ser exibida durante o evento e no nosso site. Nos dias da Cúpula, quem tiver seu material pronto poderá deixar conosco para serem exibidos". 



Outra apropriação da comunicação pelos movimentos sociais é a Rádio Cúpula, construída por diversos coletivos de rádio. Porém nem só de materiais prontos vive essa rede. Durante a Cúpula, o Laboratório de Comunicação Compartilhada também auxiliará produtores que queiram finalizar seus projetos no evento. O portal da Cúpula tem um esapaço específico para o envio de conteúdo e integração entre produtores da Rede dos Povos, para conhecer visite o sitehttp://rede.cupuladospovos.org.br .


Cúpula, um contraponto à Rio+20


A cidade do Rio de Janeiro receberá neste período a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. O evento tem esse nome por ocorrer 20 anos após a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio 92. O evento oficial acontecerá bem distante da Cúpula dos Povos, na Barra da Tijuca – região nobre da cidade - entre os dias 13 e 22 de junho no Riocentro. 



Marcelo Durão, integrante da Via Campesina e do Grupo de Articulação da Cúpula, afirma que a Rio+20 prioriza o diálogo entre presidentes e grandes empresas. "Avaliamos que a relação hoje na Rio+20 é entre chefes de Estado e grandes corporações. A sociedade ficou de fora desse debate. O diálogo aberto no último momento na verdade é participante e não participativo", denuncia o militante.



Mas não só de debates oficiais vive uma cidade com conflitos sociais. Do outro lado do Rio de Janeiro, ocorrerá paralelamente a Cúpula dos Povos, que reunirá cerca de 15 mil ativistas de todo o mundo no Aterro do Flamengo e em outras regiões da cidade. Ignorada pelos meios de comunicação tradicionais e amplamente divulgado pela mídia contra-hegemônica, a Cúpula tem entre seus eixos a "denúncia das causas estruturais das crises, das falsas soluções e das novas formas de reprodução do capital".



A programação é constituída por diversos espaços autogestionados e traz ainda um momento prático da interação entre os participantes do evento. A iniciativa conhecida como "Territórios do Futuro" é um espaço onde comunidades apresentaram suas soluções para as crises globais. 


A Cúpula conta ainda com as plenárias de convergência de propostas, divididas nos em grandes grupos temáticos: Direito, por Justiça Social e Ambiental; Defesa dos Bens Comuns Contra a Mercantilização; Soberania Alimentar; Energia e Indústrias Extrativas; Trabalho: Por uma Outra Economia e Novos Paradigmas de Sociedade. Veja aqui a programação completa no site oficial .

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Oficinas para o Programa Memória do Mundo – UNESCO

Com vistas a aumentar a penetração do Programa Memória do Mundo da UNESCO - Memory of the World (MOW) no Brasil, o Comitê Nacional do Brasil para o Programa oferecerá, antes da data final para submissão de candidaturas este ano (06 de julho/2012), cinco Oficinas Regionais para apresentação do Programa MOW e treinamento para redação de candidaturas. O objetivo das oficinas é diversificar o perfil das instituições que se candidatam ao Registro e aperfeiçoar as propostas apresentadas de forma que estados e regiões ainda não representados no Registro Nacional possam apresentar candidaturas qualificadas. Instituições de gestão de patrimônio documental como arquivos, centros de documentação e memória, museus, universidades, secretarias de cultura e fundações são o público-alvo das oficinas.
A primeira Oficina Regional do Programa MOWBrasil ocorreu no dia 13 de abril, nas dependências do Arquivo Público Mineiro, em Belo Horizonte, Minas Gerais, e foi ministrada conjuntamente pelo Prof. Dr. Caio Boschi (membro do Comitê MOWBrasil e vinculado à UFMG) e pelo Prof. Dr. Vitor Manoel Marques da Fonseca (membro do Comitê MOWBrasil, presidente do Comitê Regional para a América Latina e Caribe do Programa Memória do Mundo – MOWLAC, professor da UFF e vinculado ao Arquivo Nacional).
A segunda oficina, realizada no Rio de Janeiro, na sede do Arquivo Nacional, no dia 18/05, foi ministrada pelo Prof. Dr. Vitor Manoel Marques da Fonseca e por Carlos Ditadi, ambos do Arquivo Nacional.
Locais das Oficinas: 1ª Oficina – Região Sudeste – Belo Horizonte - MG – 13/04 – parceria Arquivo Público Mineiro - APM;
2ª Oficina – Região Sudeste – Rio de Janeiro – RJ – 18/05 - parceria Arquivo Nacional;
3ª Oficina – Região Sul – Florianópolis – SC – 30/05 – parceria Fundação Catarinense de Cultura – inscrições memoriaunesco20anos@gmail.com;
4ª Oficina – Região Norte – Belém – PA – 31/05 – parceria Museu Emílio Goeldi e o Arquivo Público do Pará – inscrições mgdoc@museu-goeldi.br ;
5ª Oficina – Região Nordeste – Recife – PE – 13/6 - parceria Escola Superior de Magistratura - inscrições memoriadomundo@arquivonacional.gov.br;
6ª Oficina – Região Centro-Oeste – Brasília - DF - 14/6 - parceria Arquivo Público do Distrito Federal - inscrições memoriadomundo@arquivonacional.gov.br
As oficinas são realizadas com o apoio do Ministério da Cultura (Minc).
Mais informações: memoriadomundo@arquivonacional.gov.br

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Gilmar e Veja: uma mão suja a outra

Por Alexandre Haubrich, no blog Jornalismo B

A relação entre a revista Veja e o ministro do STF Gilmar Mendes, que culminou, na última semana, em acusações contra o ex presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é antiga, e sempre costumou ser muito amistosa. A busca no acervo digital da Veja revela 140 menções a Mendes, parte delas trazendo o ministro como fonte, parte apresentando-o como um gênio do meio jurídico brasileiro ou fazendo supor que Gilmar Mendes é um dos grandes frasistas da História do país. Além disso, a pesquisa traz algumas curiosidades um tanto quanto incômodas para Mendes. Chegaremos a elas.




Entre as 140 menções, dezenas delas estão na seção “Veja Essa”, dedicada às mais interessantes – na concepção da Veja – frases da semana. Todas as citações de Gilmar Mendes são de frases fortes, espirituosas, e carregadas de ataque aos movimentos sociais e a lideranças políticas, como o atual governador do Rio Grande do Sul e ex ministro da Justiça Tarso Genro (PT).

A primeira aparição de Mendes na Veja acontece em 1992. Ele era, então, assessor jurídico do Planalto, subordinado ao ex presidente Fernando Collor, a quem defende na matéria publicada em setembro daquele ano. Gilmar Mendes só volta a aparecer na revista dez anos depois, como advogado-geral da União e candidato ao Supremo Tribunal Federal. Ali, como em 1992, Gilmar e a Veja parecem não se entender muito bem. Diz a matéria: “Dono de um estilo agressivo, Mendes é alvo de maledicências no tribunal”.

Ainda em 2002 há o primeiro capítulo da curiosidade citada no primeiro parágrafo desse texto. Lembremos que, agora, em 2012, o ministro do STF acusa Lula de ter tentado interferir nas decisões do Supremo. Pois, há dez anos, observemos o que nota publicada na Veja relatava: “Quando não se discutia a possibilidade de o advogado-geral da União, Gilmar Mendes, assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal, a relação dele com o Poder Judiciário conheceu momentos de atrito. Certa vez, Mendes enviou uma carta ao STF em que pedia aos juízes que moderassem seu contato com a imprensa”. Sim, Gilmar Mendes, quando advogado-geral da União, tentou interferir na conduta do STF. E mais: já ministro do STF, tentou interferir na conduta da Polícia Federal. Em nota da seção Radar, da revista Veja, em junho de 2007, o jornalista Lauro Jardim afirma: “O ministro do STF Gilmar Mendes telefonou na semana passada para Tarso Genro. (…) Furioso, Mendes reclamou da atuação da PF, que vazou extra-oficialmente o seu nome como um dos beneficiários dos presentinhos da Gautama (…)”.



Durante toda a crise institucional entre Gilmar Mendes e Tarso Genro, a Veja sempre posicionou-se ao lado do ministro do STF. A divergência chegou ao caso do ativista italiano Cesare Battisti, momento em que a revista aumentou o espaço dado a Gilmar para ecoar a gritaria contra o “terrorista” e seus “comparsas”. Em julho de 2008, a Veja publicou uma reportagem de quatro páginas atacando o trabalho da Polícia Federal, que estava então sob comando de Tarso.

Em 2009 começou a paixão entre Gilmar e o colunista da revista, Reinaldo Azevedo, que agora o defende aos gritos contra Lula. Em abril daquele ano, a edição impressa destacava nota publicada no blog do colunista, sobre a discussão entre Gilmar e outro ministro do STF, Joaquim Barbosa, em que Azevedo, como de costume, se investe de ares de juiz supremo: “Joaquim Barbosa está obrigado a provar, como ministro do Supremo, que seu colega tem ‘capangas’. Se Gilmar Mendes tem capangas e Barbosa tem as provas, então está prevaricando”.



Dois anos depois, em dezembro de 2011, o mesmo Reinaldo Azevedo publicava na Veja um artigo de duas páginas, intitulado “Ainda há juízes em Brasília”, em que pouco mais faz do que tecer loas a Gilmar Mendes e ao livro publicado pelo ministro. Escreve: “Mendes é juiz num país livre que quer continuar livre. Que faça escola”.


É claro que, com toda essa trajetória de carinhos recíprocos, a Veja podia contar com Gilmar Mendes quando precisasse desviar a atenção de si mesma, envolvida como está nas ligações gravadas do bicheiro Carlinhos Cachoeira, alvo de uma CPI neste momento. Ao tentarem lavar-se mutuamente, uma mão suja a outra.