Um novo marco regulatório para as ONGs |
24 de dezembro de 2012 | |
Por Vera Masagão Ribeiro*
Há um ano, a Secretaria-Geral da Presidência da República constituiu
um Grupo de Trabalho, com participação de vários ministérios e
representantes da sociedade, para elaborar um novo marco regulatório
para as organizações da sociedade civil, as chamadas ONGs (Organizações
Não Governamentais). Esse foi um compromisso de campanha assumido por
Dilma Rousseff perante centenas de entidades e redes que subscreveram
uma plataforma cujo horizonte era estabelecer novas bases para o
engajamento cidadão no Brasil.
O apoio governamental às organizações da sociedade civil que atuam
visando o interesse público é uma prática comum em países onde a
democracia está consolidada. Estudo da Johns Hopkins University revela
que o subsídio governamental às ONGs no Brasil é pequeno em comparação a
esses países. Temos aqui uma legislação insuficiente e confusa, que
dificulta o acesso das organizações cidadãs aos recursos estatais, ao
mesmo tempo que permite o uso indevido dessas entidades, por parte de
governantes, para favorecer grupos políticos ou simplesmente para
enriquecimento pessoal.
A mais recente onda de escândalos envolvendo transações desse tipo
levou à queda de ministros e ao enrijecimento dos controles sobre as
organizações que acessam recursos federais. Ainda assim, o Grupo de
Trabalho coordenado pela Secretaria-Geral da Presidência, ao qual a
Plataforma das Organizações da Sociedade Civil se integrou, conseguiu
mobilizar a contribuição de um conjunto relevante de gestores públicos,
juristas e líderes sociais que elaboraram propostas para melhorar a
relação das entidades sem fins lucrativos com os órgãos do Estado. A
mais importante delas é um Projeto de Lei que estabelece um novo
instrumento de contratualização, o Termo de Fomento e Colaboração,
estabelecendo obrigações relativas ao chamamento público e à prestação
de contas, tanto para os administradores públicos como para as
organizações.
Do ponto de vista político, o principal avanço do Projeto de Lei é
reconhecer que as organizações da sociedade civil não podem ser
reduzidas a braços executores de políticas governamentais; devem ser
fomentadas como expressão autônoma da sociedade, espaços de
experimentação de novas tecnologias sociais, canais de participação e
controle social. Um instrumento adequado para regular o repasse de
recursos governamentais às organizações é um primeiro passo necessário,
que precisaria ser complementado com o reforço e constituição de novos
fundos públicos voltados ao fomento da participação social. O ministro
Gilberto Carvalho anunciou em março a constituição de um fundo dessa
natureza, mas até agora nada foi concretizado.
Não obstante isso, e ainda que o acesso a recursos públicos seja
absolutamente legítimo, a sociedade civil organizada não pode depender
integralmente de repasses governamentais. Deve ser também capaz de
mobilizar junto à própria sociedade os recursos necessários para
promover suas causas. Para tal, precisaria contar, como em outros países
democráticos, com instrumentos para captação de recursos, como
incentivos fiscais e um regime tributário favorável. Infelizmente, no
Brasil, o mesmo imposto que se cobra da pessoa que deixa uma herança
para os descendentes é cobrado daquela que deseja fazer uma doação a uma
entidade sem fins lucrativos ou mesmo a uma universidade pública.
Para cumprir a agenda da Plataforma das Organizações da Sociedade
Civil, com a qual Dilma Rousseff se comprometeu como candidata, temos
ainda muito a fazer. Vivemos um longo compasso de espera, já que o Grupo
de Trabalho coordenado pela Secretaria-Geral da Presidência teve suas
atividades encerradas em julho e até agora não se conseguiu sequer que
seus produtos fossem apresentadas à Presidenta. No que se refere a um
marco regulatório para as organizações da sociedade civil, corremos o
risco de dar continuidade aos oito anos de promessas adiadas da gestão
Lula da Silva.
Não podemos esperar mais. Temos a palavra dada, escrita e assinada da
Presidenta. Temos também a urgência histórica, pois à medida que avança
o crescimento econômico do país, aumentam as responsabilidades que
pesam sobre seus cidadãos e governantes. Precisamos de uma sociedade
civil brasileira forte e engajada que, além de consumir mais, se
comprometa com a busca de alternativas econômicas, sociais e ambientais
sustentáveis, tanto quanto com os valores da justiça e da solidariedade.
(*) Vera Masagão Ribeiro é Diretora Executiva da
Associação Brasileira de ONGs – ABONG e membro da Plataforma por um Novo
Marco Regulatório para as Organizações da Sociedade Civil.
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